A aberração do PL antiaborto e a instrumentalização da mulher para fins eleitorais

A aberração do PL antiaborto e a instrumentalização da mulher para fins eleitorais

*Por Chris Santos

A questão da violência sexual e das políticas relacionadas ao aborto no Brasil é extremamente complexa e multifacetada. Os dados alarmantes, como os apresentados pelo Atlas da Violência, revelam a gravidade da situação e a necessidade urgente de ações efetivas e humanas para proteger as mulheres e meninas. Agressões sexuais foram o tipo de violência mais recorrente registrada contra meninas de 10 a 14 anos no Brasil em 2022, aponta o Atlas da Violência, divulgado na terça-feira (18/06). O mesmo estudo aponta que uma mulher é estuprada no Brasil a cada 46 minutos. Os números da edição divulgada em 2024 são baseados em registros no Sistema Único de Saúde (SUS) em 2022. Imagine o quanto esse número não é maior, tendo em vista as ocorrências que não são registradas.

O Projeto de Lei 1904, conhecido como “PL Antiaborto por Estupro”, levanta uma série de preocupações éticas, legais e humanitárias. Equiparar o aborto ao crime de homicídio, especialmente em casos de violência sexual, desconsidera a complexidade da condição de saúde física e mental da vítima. Este PL é mais uma aberração gerada pelo Câmara dos Deputados, em um projeto de lei apresentado pelo deputado federal Sóstenes Cavalcante (PL/DF) e com aval de Arthur Lira, presidente da Câmara, que não só acatou o PL como também o colocou para votação em regime de urgência. Mas, qual a razão dessa urgência? Porque estamos em ano eleitoral e a extrema-direita tacanha e conservadora quer usar o tema para criticar o PT. Apenas para isso. Puro antipetismo irracional. Nenhuma preocupação com as vítimas.  Para muitas mulheres e meninas que são vítimas de estupro, a possibilidade de um aborto pode representar a única maneira de retomar algum controle sobre suas vidas e corpos após uma violação tão traumática.

Reducionismo e insensibilidade

Tratar essa questão do aborto de forma simplista e, como parece ser o caso com a urgência na tramitação do PL 1904, pode ser visto como uma instrumentalização do sofrimento feminino para fins políticos. Políticas públicas devem ser baseadas em evidências e ter como foco central a dignidade e os direitos humanos das vítimas. Infelizmente, a realidade política muitas vezes desvia da racionalidade e humanidade necessárias para tratar de temas tão sensíveis.

Nossos parlamentares deveriam estar preocupados em combater a violência sexual contra as mulheres, que atinge até mesmo bebês. Até hoje não esqueço a reportagem que li de uma bebê de 27 dias que foi estuprada pelo próprio pai e morreu. Repito: 27 dias! Que ser é esse? O sexo como arma de submissão, violência e dominação da mulher é utilizado, infelizmente, pelos quatro cantos desse planeta. Os relatos das refugiadas de guerras estão aí para conhecermos os sofrimento infligido a elas.

Quantas mulheres, mesmo casadas, são obrigadas a manter relações sexuais com seus maridos diariamente à força? Quantos homens rejeitam o uso de um simples preservativo e deixam para as mulheres toda a responsabilidade do controle de natalidade? Por que os médicos brasileiros, muitos deles com apoio do decadente Conselho Federal de Medicina (CFM), deixam de apoiar crianças, adolescentes e mulheres adultas que foram estupradas e engravidam e não permitem a realização de um aborto logo que a gravidez é confirmada? São muitas perguntas que nos levam à reflexão.

Educação sexual e consentimento

A educação sexual, o acesso a métodos contraceptivos e a necessidade de mudar a cultura machista enraizada na sociedade são partes essenciais de uma estratégia mais ampla para combater a violência sexual e a consequente necessidade de aborto. A responsabilização e educação dos homens sobre consentimento e respeito das decisões das mulheres sobre seus corpos são igualmente cruciais.

Cabe observar ainda que existem médicos no Brasil que também não aceitam realizar laqueadura em jovens que já estão decididas que não querem ter filhos. Querem forçar uma decisão que não cabe a eles. Ou seja, a negligência na defesa dos direitos reprodutivos também se manifesta em atitudes como a relutância de alguns médicos em realizar procedimentos de esterilização em mulheres que não desejam ter filhos. No entanto, é fundamental que esses procedimentos também sejam abordados com consideração cuidadosa para garantir que as decisões sejam informadas e voluntárias, respeitando sempre a autonomia da paciente. Esse é outro debate que cabe ser conduzido em outra ocasião.

Diante de todas essas questões, é urgente que os parlamentares, profissionais de saúde e a sociedade em geral se unam para formular políticas e atitudes que realmente apoiem e protejam as mulheres, oferecendo-lhes o suporte necessário para viverem suas vidas com dignidade e segurança.

*Chris Santos é uma profissional com mais de 30 anos de experiência em comunicação corporativa, assessoria de imprensa e marketing digital. Com bacharelados em Relações Públicas e em Ciências Sociais, pela USP; especialização em Gestão de Processos Comunicacionais (USP); MBA em Gestão de Marcas (Branding), pela Anhembi-Morumbi; e mestre em Comunicação e Política, pela UNIP. Tem se dedicado ao estudo de tendências nas áreas de marketing digital, jornalismo, comunicação e política e tecnologias da comunicação e informação.

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